Archive for the ‘De um tudo’ Category

Plunct Plact Zum

4 de maio de 2010

Nesta quinta-feira peguei um avião, rumo a um merecido feriado prolongado. Tinha marcado meu assento para a janela e ao chegar ao meu lugar, me deparei com uma mãe no corredor e sua filha pequena, de uns cinco anos, no meio. “Argh!”, exclamei em off, minha alergia a crianças já me fazendo coçar. Bem do meu lado, ai de mim! Mas, passado o susto, fui subitamente acometido por uma inexplicável magnanimidade: “você não quer sentar na janela?”, indaguei àquele pequeno ser, quando sua mãe pediu para que ela deixasse “o moço passar”.

Não sei o que me motivou a isso, provavelmente a preguiça de ter que passar pelas duas até alcançar meu assento, ou o medo de, durante a viagem, me sentir encurralado por elas. Ou quem sabe o entusiasmo pelos promissores dias que me esperavam, ou ainda a alegria pelo fato do voo ter atrasado “apenas” uma hora. Vai saber. Mas a família toda (do outro lado do corredor estavam o pai da pimpolha com mais três de seus irmãozinhos, um deles ainda de colo – o quarto viajava em compartimento especial, a barriga da mãe) ficou tão feliz com este simples gesto, “olha, filha, na janela, que legaaallll!!!! Agradece o moço!”, “obrigado!!”, me agradeceu ela num sorriso, que me senti satisfeito com minha boa ação, tão facilmente praticada. Às vezes eu sou um fofo.

Ainda antes da decolagem eu já recebia do céu a confirmação de que havia feito a coisa certa: “mamãe, se Jesus morasse lá onde o avião sobe, a gente ia ver Jesus, né?”, indagou a inocente pequenina, que logo depois, enquanto o avião subia, constatava: “nem parece a luz das casas, parece um tapete todo brilhante cobrindo tudo”, referindo-se às luzes da cidade vista do alto. As crianças também são fofas às vezes.

Tamanho clima de anúncio de amaciante de roupas logo foi cortado pelo anúncio do comandante, que dizia que devido ao caos, digo, tráfego, aéreo, faríamos uma….escala não prevista, em Campinas, para de lá partir sabe-se Deus quando. Viajar de avião neste país é uma aventura repleta de surpresas, acredito ter sido avisada previamente minha pequena companheira de viagem por sua mãe, como forma de incentivá-la.

Mas, como bom brasileiro, logo dei um jeitinho de driblar a adversidade. Descobri três assentos vazios na parte de trás do avião, para onde me dirigi logo após o lanche e me despedir de minhas vizinhas. Coloquei o fone de ouvido, me ajeitei como pude, me encolhendo nos bancos, encostei minha cabecinha no travesseiro e, contagiado pelas vibrações infantis, fiquei imaginando que estava fazendo uma viagem bem longa, noite adentro. Afinal, quanto mais longe se vai, e mais longa for a viagem, mais legal é o lugar a que se chega! Brincando de faz de conta, logo peguei no sono. Daqueles angelicais.

E nem demorou tanto assim. Mal tinha começado a babar quando tive que voltar à posição vertical para a nova (e última) decolagem. Chegando ao destino final (enfim), ao sair do avião estava tão chapado de sono que vi Jesus Cristo na pista, recepcionando a mim e à grande família, de braços abertos, nos saudando: “vinde a mim as criancinhas!”.

Foto: gooooooogle

Arquivo: junho 2007

Com carinho ao mestre Yoda

2 de maio de 2010

Depois da praga do gerundismo, outra indigesta ameaça paira sobre nossa tão agredida Gramática. É o yodismo. 

“Bebida acompanha?”, meus pobres ouvidos já tiveram a infelicidade de ouvir de atendentes em algumas fast-foods, eu que quase nunca vou a estes igualmente indigestos estabelecimentos. “Não, bebida não acompanha”, respondo. 

Outro dia, fui obrigado a ouvir esta: “Estacionamento utiliza?”. Não. Aí já é demasiado. O que esses vândalos gramaticais têm contra nossa bela língua portuguesa? 

Tão mais fácil dizer “entraremos em contato” do que “vamos estar entrando em contato”. Três palavras em vez de cinco. 19 letras no lugar de 27. Porque o que geralmente ocorre é a economia de palavras, “vambora!”; de letras, “como cê tá?”. Por que então cargas d’água dizer “vamos estar entrando em contato” e não “entraremos em contato”????? POR QUÊ????

E mais esta agora. Não satisfeitos com o gerundismo, agora tentam (e decerto conseguirão) implantar o inversionismo, ou yodismo. Me digam, senhores atendentes, tradutores de manuais de atendimento, gerentes, enfim, quem quer que seja, alguém me responda: POR QUE “BEBIDA ACOMPANHA” E NÃO “ACOMPANHA BEBIDA”????? POR QUÊ???????

(Não, não vou mencionar aqui outra pérola do mau gosto e ignorância em voga, o “não vou ter”. É quando você pede algo e ouve de resposta “não vou ter”. “Então me dá logo enquanto tem!”, dá vontade de responder)

No dia do fatídico “estacionamento utiliza?”, tive que desabafar com alguém, e minha amiga Cocotinha encontrou uma explicação para o….fenômeno: “É o yodismo!”, afirmou ela. “Yodismo?….”, boiei. “Sim, Pu, você não viu Star Wars?, o Yoda fala ao contrário!”. 

E matou a charada Cocotinha minha amiga. “Do lado da Força está você”, “Paciência precisa você ter”, “Mas não é mole não, rapadura é doce” etc., assim falava o pequeno grande guerreiro verde a seu discípulo Luke Skywalker.

Bem, então para estar do lado iluminado (?!?!) da Força, quando for travar relações comerciais com um seguidor do mestre Yoda, após responder se bebida acompanha ou não, encerrarei assim a conversação: “cartão de crédito aceita?”.

Foto: gooooooogle

Arquivo: junho 2008

Meninas e meninos

1 de maio de 2010

“Era tanto sangue, mas tanto sangue, que a mulher ‘chegava sentir’ prazer!”, contava, enfatizando a última palavra, a estudante para seus colegas de escola que a acompanhavam no metrô, sobre uma das cenas do filme O albergue II. Filme que, aliás, ela teve tempo de descrever inteiro para seus ouvintes, durante o caminho.

Eu vi O albergue II, me lembro da cena: uma das sádicas vilãs tomava literalmente um banho de sangue de sua vítima, pendurada de ponta cabeça acima de sua banheira, enquanto era cortada viva, se bem me lembro por espadas ninjas, por sua algoz (há gosto pra tudo, sexual e cinefilamente falando).

Mas, não sei por quê, pego assim desprevenido em meio à narração da cena, me veio à cabeça uma outra imagem que associa sangue e mulher. Sim, isso mesmo. Não sei por quê, repito.

O que sei é que tal imagem de horror me causou bem mais medo do que a sanguinolenta cena d’O Albergue II.

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“Tudo bem? Prazer, meu nome é Tiago, estou começando hoje. Mais um Tiago pro time!”. Era o novo professor da academia que se apresentava pra mim. Os professores da academia onde malho são muito bem treinados, digo, simpáticos, sempre cumprimentam os alunos e perguntam se precisamos de algo – certa vez, estava eu sentado em um aparelho descansando e só nesse minuto veio uma sequência de três, quase um depois do outro. A gente se sente muito importante, praticamente um Godfather recebendo a benção de seus afilhados.

“Bem-vindo, Tiago”, respondi ao novo professor, também querendo ser agradável. E fiquei curioso para saber quem seriam os outros Tiagos. Que nem sei se são Tiagos ou Thiagos. Eu não sou simpático como os professores. Não os conheço pelos nomes, pra mim até então todos se chamavam “Opa, tudo bom?”. Até descobrir que ali há uma série de Tiagos, mesmo nome, mesma roupa. Já li esse livro.

Dias depois, me ligou uma mocinha, também muito simpática, fazendo uma pesquisa de opinião com os alunos da academia. Geralmente não respondo pesquisas, mas achei que seria justo retribuir tanta boa educação e qualidade juntas vindas de um só serviço, coisa rara hoje em dia, há que se incentivar.

Elogiei a academia como um todo, as instalações, aparelhos, limpeza, fazendo apenas a ressalva da falta de uma sauna em que eu pudesse abrir meus poros e criticando a trilha sonora, som de barbie frita. Tive que explicar este último item à mocinha, que achou graça, “hihihi”. Risadinha de japonesa, achei tudo ainda mais gracioso.

Mas é claro que ressaltei a simpatia dos professores: “Os professores são muito atenciosos. Vocês têm Tiagos muito simpáticos”.

Imagem: goooooooogle

Arquivo: junho 2008

Sexo implícito

28 de abril de 2010

Para os anais do duplo sentido – parte 1

“Ela me deixa louca é por trás!”, confessava Robudinha, bem na hora do almoço. Não, minha amiga não é adepta de prática sexual comum entre dois homens aplicada a duas mulheres, Robudinha que nem chegada em meninas é. Ela se referia a uma velha famigerada nossa, que costuma deixar todos loucos de raiva, mas que em relação a ela faz as coisas às escondidas. Ah, tá….

Para os anais do duplo sentido – parte 2

“Como você prefere atrás?”, quis saber de mim a cabeleireira. Não, não respondi “com carinho”, ou “só por amor”. Ela estava me perguntando sobre como eu queria que ela aparasse meu cabelo atrás, ou seja, naquela parte da anatomia humana conhecida como nuca, afinal era a primeira vez que ela me atendia, e não conhecia minhas preferências – estético-capilares! Mas que ficou estranho, ficou. A colocação dela, não o resultado do corte, felizmente. Caprichou, Susie!

O KY da Beth

Beth Chiclete, companheira de labuta, veio tirar comigo uma dúvida de português. Acabamos falando sobre a maldita…reforma…ortográfica, aquela que acabou com nossa língua, um dos últimos patrimônios nacionais dos quais ainda podíamos nos orgulhar (nos restando o carnaval, o futebol, o Cristo Redentor….e a bunda da mulata).

Em relação a um ponto da “reforma”, Beth declarou que não teria problemas em se adaptar: “eu sempre usei k, y e w!”. Lógico que eu não poderia deixar essa passar em branco: “você sempre usou KY?…”. “E w!”, complementou Beth.

Achei melhor não me estender no assunto. Pelo menos não dessa forma, tão a seco…

Cheia de si…

Estávamos eu e Papai Sabe Tudo parados em um sinal de trânsito. No que passa uma louríssima (ainda que não de nascença, muito provavelmente), peitoril empinadíssimo (ainda que não de nascença, certamente), bronzeadíssima (ainda que artificialmente) e modelito justo e coloridíssimo do tipo “gente, cheguei!!!”.

Atravessava ela a rua em toda sua autoestima turbinada, carregando sacolas de roupas de grife. “Cheia de si!”, arrisquei eu um comentário, para não ter que ficar sem falar nada diante de tanta…pompa.

“Cheia de si-licone!”, bem complementou Papai Sabe Tudo, este sim menos atento ao perfil psicológico do que nos atributos físicos da moça.

De onde viemos

História contada por minha irmã Material Girl:

Seu filho caçula Espoleta viu uma foto de Material G. da época em que ela estava grávida dele, com o primogênito Afilhado a seu lado. “Espoleta!”, apontou ele para seu irmão mais velho na foto, acreditando tratar-se dele próprio.

Explicou sua mãe: “não, Espoleta, este é o Afilhado. Na verdade, nesta foto você ainda estava dentro da minha barriga, olha como ela estava grande!”. Espoleta olhou. E concluiu, horrorizado com a antropofagia materna: “você me comeu?!?!”.

Seu pai, que escutava a conversa, deu sua contribuição didática: “não, eu que comi a mamãe”, explicou assim meu cunhado a origem da vida a seu filho, que diante de tanta informação canibalista se calou, de olhos arregalados.

A cabeça do pequeno Espoleta deve ter dado um nó.

Foto: goooooogle

Arquivo: abril 2009

Simples assim

27 de abril de 2010

Fila de um teatro no Leblon, RJ. Dois distintos cavalheiros de meia-idade conversam enquanto suas senhoras foram comprar “balinhas diet” na farmácia ao lado:

– Hoje eu vi um troço super legal enquanto andava na praia, um grupo de pessoas pulando corda.

– Pulando corda?

– É, você precisava ver, era algo bem inusitado, bem bacana.

– Mas era muita gente?

– Devia ser umas dez pessoas, tinha uma gordinha, uma pretinha e um homem mais velho…

A felliniana descrição de uma cena aparentemente banal de um corriqueiro domingo me inspirou, e comecei a visualizar o peculiar grupo, a gordinha, a pretinha e o homem mais velho à frente e os demais componentes em segundo plano. Imaginei-os envoltos por uma espécie de névoa bem fina, daquelas matinais, que não comprometesse a visão do espetáculo, só o suficiente para dar o clima.

Pronto. E eu que vivo sempre no mundo da lua, peguei carona na cauda dessa cena real que trouxe tanto encantamento a pelo menos um de seus espectadores e nela comecei uma onírica viagem particular. Assim, passava em frente ao grupo uma menininha de trancinhas, andando de velocípede (ainda existem velocípedes?). Ela pedalava em direção a pequenos escorregas e casinhas feitos de plástico, coloridos, como aqueles brinquedos do Baixo Bebê. E um cachorro adestrado fazia das suas, andando em círculos nas patas traseiras e latindo para chamar (mais ainda) a atenção para si. Todos embalados por uma trilha sonora semelhante a de uma caixinha de música, só que orquestrada pelo Nino Rota. E tudo isso acontecia em câmera lenta, como se eles não quisessem nunca sair dali.

– Será que eram de uma academia?, o amigo do empolgado narrador da bela-por-si-só-em-toda-sua-simplicidade cena tinha que encontrar uma explicação plausível para ela.

– Não, mas pulavam muito bem, era muito bonito.

– Eles estavam fazendo uma apresentação teatral?

O incompreendido senhor de alma sensível já se impacientava com seu amigo paquiderme:

– Não. Estavam pulando corda.

E mudou o assunto.

Foto: goooooogle

Arquivo: maio 2008

Antropológicas

26 de abril de 2010

“Eu vou dar um piti! Eu vou dar um piti!”, anunciava exaltado a seu(ua) amigo(a) um(a) tio(a)zinho(a) da fila da frente no cinema. Ele já se estressava com a possibilidade de perturbação da ordem por parte de um(a) vizinho(a) de algumas cadeiras ao lado, que tagarelava com sua amiga durante o trailer (entre outros temas, contava a ela sobre sua última ida ao cinema, quando uma mulher sentada atrás dele(a) lhe pediu que abaixasse a cabeça: “ah, enfia no c….!”, desabafava ele(a) com afetação – um saco de pipoca para quem adivinhar qual era o cinema de SP em que então coexistiam esses dois personagens!).

Eu iria ver o mais novo filme de super-herói que chegava às telonas, e já me sentia respaldado por alguém que me pouparia da função do extenuante “pssssssssiiiiiiiiuuuuuuuu!!!!!!!” durante a sessão – meu herói! – e prometia ser bem divertido, o confronto entre aqueles dois representantes de tão diversa fauna. Na tela, o homem era de ferro, mas a bicha da plateia também não era mole, não…

Mas infelizmente a ação se resumiu à ficção, justo naquela sessão em que pela primeira vez eu torcia para que alguma vaca miasse durante o filme, que algum espírito de porco exercesse toda a sua inata má educação e batesse papo despreocupadamente, só para vê-lo bater de frente com o piti do(a) tio(a)zinho(a).

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“Não pode estacionar aí, não! Não foi pra escola? Não sabe o que diz a ‘praca’?”, bradava o segurança para o motorista que estacionava em local proibido, bem debaixo da sinalização.

Sujeito burro mesmo aquele. O segurança tinha razão, só pode ter faltado à escola, do contrário entenderia a “praca”. Esses maus motoristas são um pobrema.

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“Capricha, Susie!”, exclamou o cabeleireiro para sua colega, ao vê-la receber uma cliente que queria um novo visual para ir a um casamento. Adorei. Pelo forte apelo metafórico contido nesta aparentemente singela expressão.

Funciona assim:

Um amigo vai prestar prova para um concurso público? Encoraje-o: Capricha, Susie!

Vai ter uma entrevista de emprego? Capricha, Susie!

Vai viajar? Capricha, Susie!

Vai ter um encontro amoroso? Capricha, Susie!

São muitas as possibilidades! Eu mesmo, antes de iniciar uma nova crônica, passei a dizer pra mim: Capricha, Susie! 

Foto: gooooooooogle

Arquivo: maio 2008

É bom, mas faz mal

24 de abril de 2010

Restaurante/bar na Praça Roosevelt, ao lado do Espaço Satyros. Fazendo hora para o início da peça, fui beber algo. Um mate Leão, saudável que sou. Porém, gordo que também sou, não pude deixar de resistir aos graciosos docinhos árabes, que me chamavam do balcão, ali como que embrulhadinhos em uma burca de celofane, dentro de uma cestinha. Peguei um de nozes.

“Esse doce é uma delícia, né?”, a mocinha que me atendia também era um doce, de pessoa. “Aliás, todos os doces árabes são ótimos, os doces árabes são os melhores do mundo!”, completou ela, enchendo a boca (metaforicamente, e não dos melhores doces do mundo) pra falar.

(Dizem que as pessoas no mesmo nível espiritual se reconhecem. Aquela mulher certamente é uma magra de alma gorda como eu. Em minha última incursão por ali (sim, eu era reincidente!) ela me recomendara o bolo de fubá com coco feito por eles: “você não quer provar o bolo de fubá com coco? É fofo, molhadinho, prova que é uma delícia, você vai adorar!”. E adorei mesmo. Ela me via pela primeira vez. Como então sabia exatamente como me fisgar?…)

“Os árabes e os portugueses”, opinei, respondendo à sua colocação. “Os portugueses também, mas estes têm muito ovo”, ponderou ela. “Sim, eles são ovo puro…”, concordei, “…são ótimos para o colesterol…”, gracejei, “…mas são os melhores!”, concluí defendendo os deliciosos doces da terrinha, ora pois.

“Mas é assim, né? Hoje em dia tudo o que é bom faz mal”, arrematou ela.

É verdade.

Foto: goooooooogle

Arquivo: abril 2008

Afogando em números

24 de abril de 2010

Fim de praia no sábado carioca. O outrora escaldante sol já vai descendo, a quantidade de gente de horas atrás se encontra agradavelmente reduzida. Essa é a melhor hora da praia. Pra relaxar. E se deparar com loucos e afins. Como as meninas que vieram vender amendoim para mim e meu amigo Gominhos Peludos no sábado em questão.

Estávamos eu e GP curtindo as últimas horas do dia à beira-mar quando as protegidas de Deus (todos sabem que Deus protege os loucos e as crianças. E as crianças loucas, claro) se aproximaram com um grande saco contendo saquinhos da acneica mercadoria. Medo. Minha pele já começou a coçar. Não, não sou alérgico a amendoim. Sou alérgico a crianças.

“Quer amendoim, tio?”, abordaram-nos familiarmente, uma se atirando de joelhos na areia e a outra se sentando, como amigas de praia, a nosso lado. “Não, obrigado”, declinamos. “Só um amendoim, compra aí!”, insistia a mais falante.

“Não temos dinheiro”, mentimos. “Ah, mas vocês comem sanduíche, sorvete, tomam caipirinha, e não têm dinheiro pra comprar amendoim?”, nos colocaram contra a parede, contando nos dedos cada um dos itens citados, enquanto jaziam junto a nós, denunciadores, um copo de mate e uma garrafinha d’água.

“Pois é, já gastamos todo o nosso dinheiro, não sobrou nada”, Gominhos tentava despistar. “Só R$ 2,00 cada!” – acho que esse é o que chamam de ouvido de mercador. “Ó, R$ 2,00 pra você, R$ 2,00 pra ele, quanto dá?”.

“R$ 22,00”, disse eu. “Ai, não é nada!”, chocaram-se ao mesmo tempo as meninas, fazendo cara de susto. “Quanto é 5 + 5?”, queriam confirmar minha incapacidade matemática. “55”, respondi. “Ele não sabe!!!”, impressionavam-se ainda mais. “E 4 + 5?”. “45”. “NÃO!”, uma delas bateu com a mão na testa. “Peraí. E 1 + 1?”, tentou do básico minha professora improvisada, fazendo a respectiva sinalização com os indicadores da mão direita e da esquerda. “11!”, respondi de pronto, para horror de minhas novas amigas: “Ai, que burro!”, já se indignava a outra, um pouco menos paciente comigo.

“Você nem conhece a tabuada!”, deduziram. “Pra passar roupa?”, Gominhos também demonstrava conhecimentos limitados. “Não!!! Quer ver? Eu sei quanto é 9 + 9!”. “Quanto é?”, desafiamos. “10! Olha…” – e começou a contar nos dedos: “…1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10!”.

Gominhos Peludos, que já devia estar se preocupando com o exemplo que eu dava às mentes em formação, achou por bem cumprir então seu papel de adulto e ensiná-las: “não…é 18. Quer ver? Nove…”, começou mostrando o número nas duas mãos, “…10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18”, concluiu, contando didaticamente nos dedos. “Olha ele roubando!”, denunciou uma. “Ele acha que a gente é boba!”, revoltou-se a outra.

Vendo que não conseguiriam vender um único saquinho de amendoim ali, logo foram tentar em outra freguesia. Porque definitivamente fazer contas não era a nossa praia.

Imagem: goooooogle

Arquivo: março 2008

Um par de verdades

19 de abril de 2010

1ª) Conveniente, ou Rapaz sincero que sou

“O que eu preciso fazer pra você me olhar, hein?”. Sim, tive a infelicidade de ouvir uma dessas, em uma daquelas noites. Mirei aquele petulante ser que ousava atrapalhar meu sossego de forma tão desagradável, e lhe respondi o que ele queria saber, com toda a sinceridade de meu coração: “morrer e nascer de novo”. “Nooosssaaaaa, desculpa, viu?”, e bateu em retirada a inconveniente criatura, levando no bojo a resposta que lhe cabia.

Depois pensei bem e me dei conta de que não deveria ter falado daquele jeito com o moço. Eu deveria ter sido mais claro. Porque o fato de ele morrer e nascer de novo não implica necessariamente que eu vá lhe dirigir um olhar em sua nova apresentação física. Seria apenas uma possibilidade.

2ª) Inconveniente, ou Dos meus

Na sala de exercícios da fisioterapia: “Meu genro foi surfar na Nicarágua”, contou um senhor, após uma senhora comentar que eu parecia estar surfando no exercício de equilíbrio que eu fazia, “vai sair daqui campeão de surf, hein?” (na fisioterapia se escuta coisas desse tipo).

“Não sei o que ele foi fazer lá, imagina só, surfar na Nicarágua!”, intrigava-se ele, esperando obter de nós alguma luz sobre o assunto, tipo “o litoral nicaraguense é excelente para a prática de surf!”, “altas ondas por lá, bicho!”. Mas nenhum de seus debilitados companheiros sabia dizer algo sobre as condições marítimas ou eólicas do lugar.

“Ele foi tirar férias da mulher!”, palpitou então curto e grosso um de nossos colegas, que até então mantinha-se calado e alheio a conversas.

“É…..minha filha…..”, balbuciou sem graça o pobre pai.

E súbito meus olhos começaram a enxergar o autor da nua e crua hipótese como uma criança que olha para um adulto que admira e pensa, “meu herói!”. Quando eu crescer quero ser igual a ele.

Foto: gooooogle

Arquivo: agosto 2008

Chuta que é macumba!

12 de abril de 2010

Dois bêbados conversavam em um ônibus no Rio de Janeiro. A certa altura, um deles, mais bêbado que o outro, revelou a seu parceiro de pinga: “aquela fruteira que você viu lá em casa eu peguei de uma macumba”.

E principiou o relato da aquisição do referido objeto, contando sobre como abordou a, digamos, autora do….trabalho em plena execução de sua atividade: “ô sua macumbeira do c…..!”, e sobre como os dois começaram uma acalorada discussão.

“…daí ela disse pra mim, ‘vai tomar no seu c……, seu v…… filho da p…….’ e eu dei um chega pra lá nela e disse, vai pra lá, sua macumbeira f……”, narrava ele a emocionante batalha do mal contra o mal. “Vou fazer um trabalho bem feito pra você, seu corno f…..de uma p……!”, repetia ele quase que orgulhoso as injúrias que dirigira a ele a injuriada mulher.

Não, o amigo não se pronunciava a respeito, dormindo que estava, mas o intrépido bebum não parecia se importar com isso: “…aí, depois que eu peguei a fruteira, pedi: manda uma sacola aí pras frutas!”, continuava ele, sem esclarecer o que fora feito de sua opositora nesta altura do duelo, ou contar quem o auxiliara com o saco para o transporte das…oferendas.

“Mas aquela macumba não vai dar certo, não. A mulher não fez direito, as frutas estavam verdes. O abacaxi estava verde, a manga estava verde. Não vai fazer efeito, não”, apostava ele.

Parou por uns segundos, puxando pela memória de bêbado, e fez a ressalva: “Só a goiaba estava madura. A goiaba estava gostosa”.

Pé de pato mangalô três vezes.

Imagem: goooooogle

Arquivo: abril 2008